ARTIGO.
OS
VENTOS DO DESENCANTO
Por Paulo Afonso Linhares – Advogado
Cada vez mais constantes são os lamentos, nesta bela terra de Poti, pelo desmonte da indústria petrolífera, sobretudo, com a desmobilização das atividades da Petrobrás no Rio
Grande do Norte, decorrente de vários fatores que vão da enorme crise por que
passa essa estatal até as novas perspectivas de investimento na exploração de petróleo em águas profundas,
na
camada do pré-sal (em 15 de abril corrente nos campos de exploração
das Bacias de Santos e de Campos a Petrobrás atingiu a marca da produção de 428 mil barris de petróleo por dia – bpd). A opção da empresa é muito clara: se o petróleo produzido nos campos em terra,
como é o caso da bacia potiguar, tem custo bem mais alto e menor produtividade
que o petróleo do pré-sal, os investimentos devem ser orientados para a
abertura de novos campos de exploração em águas profundas. Assim,
gradativamente a Petrobrás vai sair do RN, à medida que for cessando a produção de óleo nos poços terrestres desta região,
tendência esta dificilmente reversível.
Esse desalento pela perda do importante cluster industrial petrolífero começa a ser compensado pela
crescente importância da implantação de diversos empreendimentos ligados à exploração da energia eólica, inclusive as
chamadas “fazendas de vento”. Infelizmente, por falta de agilidade do governo
estadual, o RN perdeu para outros Estados, inclusive seus vizinhos, alguns
importantes empreendimentos ligados à fabricação dos componentes de geração de
energia eólica. Essa mistura inércia política, despreparo e incompetência faz
pensar naquilo que diz Peter Drucker, pensador austríaco
considerado o pai da administração moderna: "Pode ser dito sem grande simplificação que não há países subdesenvolvidos. Há apenas os subadministrados". Lastimavelmente, o RN tem sido apenas
subadministrado, a despeito do seu enorme e multifacetado potencial econômico,
com ênfase na produção de energia.
Com efeito, o RN é detentor de uma privilegiada conjunção de fatores para
produção de energia a partir dos ventos. Numa abordagem bem singela e despida
de apuro técnico, pode-se afirmar que “a energia eólica é aquela obtida a
partir da movimentação das correntes atmosféricas (vento). Constitui uma fonte
inesgotável
de energia, renovável, limpa e disponível em todos os lugares. Os ventos são gerados pela diferença de
temperatura da terra e das águas, das planícies e das montanhas, das regiões
equatoriais e dos pólos do planeta Terra. A quantidade de energia disponível no
vento varia de acordo com as estações do ano e as horas do dia” (disponível:
< http://bit.ly/Rxp95m
> acesso: 08mai2014).
A vantagem que tem o RN, de ter condições
favorabilíssimas para produção de energia limpa a partir da utilização dos
ventos, infelizmente sucumbe em face de regra constitucional que estabelece a
imunidade tributária da energia elétrica nas operações interestaduais, a
exemplo do que ocorre com o petróleo e seus derivados líquidos e gasosos.
"O constituinte de 1988, a pretexto de preservação do monopólio da União previsto no art. 177, da Carta Magna, estatuiu imunidade tributária "sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica" (grifou-se), segundo dicção da alínea "b", inciso X, § 2º, art. 155".
Foi o que dissemos em 1995, há longos 19 anos, no texto publicado sob o título "A Imunidade Tributária
do Petróleo Bruto como Fator de Aumento das Desigualdades Regionais"
(Linhares, 1995) e acrescentamos, em significativo passo da introdução,
que "[...]Tudo parte da indagação singela: se o Rio Grande do Norte é o segundo maior produtor de petróleo do Brasil, sendo o primeiro maior na produção terrestre, alcançando a cifra de quase 100 mil barris/dia, por que figura como um dos mais
pobres Estados da Federação, posto que mais de 70% de sua população está
na faixa da absoluta miséria? Não faz nenhum sentido tamanha distorção. As perdas do RN com a imunidade do petróleo bruto e do gás natural correspondem,
praticamente, à
metade do valor de sua receita mensal. Recursos estes
essenciais para o financiamento de obras infra-estruturais imprescindíveis a qualquer projeto de desenvolvimento do Rio Grande do Norte".
Hoje, o petróleo produzido em terra pelo RN não chega
a 60 mil bpd e gera insignificante receita tributária de ICMS, tudo
porque mais de 80% desse petróleo e seus derivados são objeto de operações
interestaduais e, portanto, imunes tributariamente. Tributo mesmo somente pagam
os potiguares, pelos poucos (e caros) derivados de petróleo que consomem. O
mesmo ocorrerá com os tantos megawatts de energia gerada pelos ventos que
impulsionam as pás dos grandes aerogeradores
nas terras potiguares, a ser remetida para outros Estados sem pagamento
de ICMS. Em suma, o RN está fadado a não receber tributo pela venda da energia
elétrica produzida nos seus parque eólicos, com aprofundamento dos desequilíbrios
do pacto federativo em seu desfavor e um perverso incremento das desigualdades
regionais e sociais, com a condenação das gerações atuais e porvindouras ao
inquebrantável anel de ferro da miséria e desesperança.
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