ARTIGO.
* Por
Honório de Medeiros
É muito ruim quando a maturidade surge impregnada de descrença. O Homem fica melancólico, quando não amargo. Embora digam que esse é o preço que se paga pela chegada do outono da vida, prefiro atribuir tal descrença a circunstâncias que fogem ao seu querer, mesmo se contra elas tenha lutado a boa luta, aquela que se supunha não ser vã.
Que
circunstâncias seriam essas, caberia a pergunta. Poderia ser diferente, se elas
fosse outras? Ou, por outro lado, se essas circunstâncias fossem diferentes
seria possível imaginar que a maturidade surgiria sem descrença, mesmo que
acompanhada da constatação de que o espírito está preso numa estrutura que o
tempo vai comprometendo lenta mas insidiosamente?
Creio que
sim. Poderia ser diferente se elas fossem outras. Mas não o são, e aqui estou
eu, em plena maturidade, descrente, talvez melancólico, mas não amargo.
No meu
caso essa descrença diz respeito ao que concluo quando observo o que se passa
em meu País e meu Estado. Espero não estar errado - acredito sinceramente que
não estou - mas minha conclusão é que, no geral, estamos muito pior, hoje, se
comparado com ontem, ou mesmo anteontem.
Entendam-me.
Não nego avanços, pois os há. Apenas sustento que esses avanços aconteceram
espontaneamente, decorrentes da própria lógica do capitalismo primitivo
brasileiro. E são poucos. Eu diria que também são superficiais. E ainda digo
que a questão é que a descrença não resulta do pouco que avançamos, ou da
fragilidade dos nossos avanços, conquistas da Sociedade. Resulta do quanto
deixamos de avançar graças às nossas elites políticas predatórias,
inconsequentes, criminosas.
O Estado,
uma hipostasia, concretamente nada mais é que a expressão financeira, legal e
policial dessas elites políticas.
O
resultado desse atraso no avanço, digamos assim, cada um de nós, brasileiro,
norte-rio-grandense, pode aquilatar meramente se dando conta - e fazemos isso,
dia-a-dia - do que está acontecendo no nosso entorno. Não quero sequer mencionar
o descalabro na educação, saúde, infra-estrutura, segurança pública - esta, no
meu entender, caso para intervenção federal no Estado. Menciono, e é o
bastante, a situação das consequências da seca no resto do Estado, para além
dos limites caóticos de Natal.
Pois a
seca, a mesma seca que angustiou D. Pedro II há tanto tempo atrás, essa seca
dizimou, no interior, a agricultura, a pecuária, a criação, a piscicultura, as
feiras, o comércio, a construção civil, nesses últimos anos. Agora a seca está ameaçando
a sobrevivência das pessoas, principalmente dos mais humildes, condenados estes
a fazerem uso de água misturada com lama para satisfazerem suas necessidades
fundamentais; a seca está conduzindo as pessoas para patamares antigos de
desrespeito ao ser humano que as novas gerações, se os conhecem, o é por meio
da literatura...
Enquanto
isso o Governo do Estado constrói um complexo denominado pomposamente
"Arena das Dunas" para a Copa do Mundo de 2014 ao mesmo tempo em que
o sertanejo e o Sertão potiguar se desfazem em sol, poeira e sede, e alguns
privilegiados, para os quais essa questão é algo remoto, se preparam para
contemplar e usufruir desse templo do supérfluo, da trivialidade, da falta de
respeito com a condição humana.
Ainda por
cima há os que creem firmemente que a construção da "Arena das Dunas"
é algo defensável. E a defendem. E apresentam estatísticas nas quais se embasam
para apresentar essa defesa. E falam e escrevem defendendo o impacto econômico
favorável ao Rio Grande do Norte em decorrência do dinheiro federal que está
vindo às catadupas.
Um
complexo que será visitado e usufruído pelas elites, um complexo inacessível à
base da pirâmide social, um complexo desnecessário para todo o restante do Rio
Grande do Norte.
Essa é
apenas uma das faces da tragédia. E quanto às mortes que estão ocorrendo no
nosso Estado, originando estatísticas semelhantes à de guerras civis?
Há ou não
motivos para descrença?
(*) Mestre em Direito; Professor de Filosofia do Direito
da Universidade Potiguar (Unp); Assessor Jurídico do Estado do Rio Grande do
Norte; Advogado (Direito Público); Ensaísta.
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