ARTIGO DA SEMANA.
SEU LIBÓRIO VOLTA À CENA
(Por Rubens Coelho - rubensfcoelho@hotmail.com)
O
homem andava sumido, seu Libório da Picada Um, há dias que não o via, ele se ausentara da cidade, e
eu por absoluta falta de tempo, não ia
à sua fazenda. O fizemos no último fim de semana. Estava
sentindo falta da prosa limpa, firme
e sincera do rijo sertanejo, já com seus 85 janeiros, completados dia 14
de julho passado, data significativa para si, para os familiares, amigos, até
para a história, pois foi também num 14 de julho que ocorreu a Queda da
Bastilha em 1775, emblemático acontecimento da Revolução Francesa, que deu cabo
ao absolutismo feudal.
Eu e minha esposa, fizemos
parte do restrito grupo de amigos do seu
Libório, convidado por dona Gertrude a participar da comemoração de aniversário
do seu companheiro de muitas décadas.
A casa estava cheia: os filhos,
noras, netos, bisnetos. Até o Zeca, filho mais velho, sargento reformado da PM
de São Paulo, veio para comemorar esse
dia festivo. O patriarca estava radiante. Compartilhávamos do
momento jubiloso. Ver uma família
ajustada, em torno do núcleo de origem, de pais provectos, um dos quais,
completando dezesseis lustros, forte como uma rocha, lúcido e sábio, sem dúvida
alguma é um privilégio.
A prosa no alpendre rolava solta entre os homens, a criançada brincava no
terreiro, correndo atrás de galinhas soltas, de cabritos que se aproximavam
curiosos por causa do burburinho do ambiente.
Tinha também menino brincando de cavalo-
de- pau, feito do talo da folha de carnaúba. Animação geral naquele ambiente
lúdico.
Seu Libório, claro, o centro das
atenções, extravasava sentimentos de um
homem idoso, como se auto qualifica.- Velho, é coisa em desuso ou
imprestável, e, em tratando-se de gente, é quem não acompanhou o tempo,não se adaptou
ao novo, à realidade.diz – Porém, adverte,nem toda novidade é boa. -
Aliás, a maioria é detestável, principalmente quanto aos costumes sociais. Mas
inevitáveis, temos de conviver, sem
contudo, deixar-se envolver, ou se imiscuir com certo modismo besta, conclui.
A política veio à tona, a
cassação de Demóstenes Torres e o aperto de mão entre Lula e Maluf, foi o
assunto. Seu Libório implacável
sentenciou;- Olha, com a minha idade, nada mais me surpreende, em Brasília por
exemplo, é como diz a música: “Se gritar
pega ladrão, não fica um meu irmão”. – Falei, mas seu Libório tem gente boa
também, patriota, honesta. - Sei disso, mas os bons são tão poucos, que
terminam sufocados na lama da maioria
podre. – Ora, se até Lula, achou agora de dar cartaz a Maluf a maior ratazana
desse país, impedido de viajar pelo mundo, para não ser preso pela Interpol?! O
que mais se esperar? É tudo lavagem do mesmo cocho.
A conversa ia esquentando, quando
Zeca saiu em defesa de Lula, mas dona Gertrudes interrompeu o debate, nos
chamando para o almoço posto na ampla mesa da sala de jantar. Um banquete sertanejo: arroz vermelho; feijão
verde, paçoca, pirão, farofa d’água; de milho; costela de porco assada;
carneiro cozido; rabada; mão-de-vaca e sarapatel. Tudo com direito a sucos de
cajá e tamarindo, como acompanhamento. Depois a sobremesa: chouriço, rapadura,
doces de leite e goiaba em
calda. Tudo da melhor qualidade, feito pelas habilidosas mãos
de dona Gertrude.
Terminado o lauto almoço, as
redes brancas de algodão, estavam armadas no alpendre, para que os comensais
tirassem a tradicional soneca. Feito prazerosamente pelos presentes.
Voltamos para Mossoró, a
tardinha, o sol se pondo. Satisfeitos
pelo dia festivo na casa dos nossos compadres e amigos: seu Libório da
Picada Um e dona Gertrudes Pereira Silva.
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