EM BUSCA DE UM PARTO HUMANIZADO.

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Narinha mora no Rio, está no quarto mês de gestação do primeiro filho e quer fazer parto normal. Ela ficou entusiasmada com a experiência da cunhada que mora no Canadá e teve o bebê em casa, com a ajuda de uma enfermeira parteira e do marido. Lá é assim, meses de acompanhamento, preparo e orientação da gestante para o parto natural, sem interferência médica; a institucionalização só ocorre em situações de risco ou por preferência da mulher. As enfermeiras-parteiras é que fazem o grosso desse trabalho. Tudo pelo sistema único de saúde canadense. No Rio, a Narinha, munida de um bom plano de saúde privado, penou mas acabou encontrando um obstetra que concordasse com a sua priorização de parto normal.Tudo parecia ir bem mas no quarto mês da gravidez, a médica começou a mudar de conversa e Narinha está novamente em busca de obstetra.

Em Fortaleza, Luciana, passou por uma situação semelhante. Apesar de ter deixado bem claro desde o início do pré-natal que gostaria de ter parto normal, no oitavo mês de gestação o obstetra propôs marcar a data da cesárea, sem nenhuma justificativa clínica. Por sorte, uma amiga lhe falou da existência das doulas, parteiras especializadas, e estas a puseram em contato com uma das raras obstetras da cidade comprometidas com parto normal. A cunhada de Luciana vive na Espanha e lá está se preparando para o parto também com a ajuda das “matronas”, enfermeiras-parteiras do sistema de saúde espanhol. Tal como em outros países europeus, no Canadá, e Estados Unidos, na Espanha além das visitas regulares ao obstetra, as grávidas são acompanhadas por essas profissionais que as orientam e preparam para o parto e para a lactação, acompanham o nascimento e ensinam como cuidar do recém-nascido. Se a mulher preferir e não houver contra-indicação, o parto pode ser feito em casa, por um serviço privado.

O que está havendo no Brasil, o campeão mundial em partos cesárea e com uma taxa de mortalidade materna incompatível com a riqueza do país, 65 mortes maternas a cada 100.000 nascidos vivos, enquanto nos países mais desenvolvidos fica em torno de 9 por 100.000 e no Chile em torno de 30 por 100.000? ...Quais as seqüelas físicas e emocionais/psicológicas para as parturientes agora transformadas em pacientes e os bebês retirados do útero materno, ao invés de passarem pelo processo natural do nascimento? Sabe-se que o parto natural é um processo com começo, meio e fim, com uma fisiologia que se completa na mulher e no bebê, deixando a ambos inteiros e prontos para a nova fase da vida do neonato, fortalecendo a mulher e o vínculo afetivo mãe e filho. Como explicar então tantas cesáreas?

Até 30 anos atrás, as mulheres brasileiras tinham seus filhos de parto normal e consideravam cesárea um evento raro e indesejado. Agora, elas se sentem inseguras de sua capacidade biológica de parir e de amamentar, hábitos tão arraigados na cultura de sua ancestralidade indígena e africana. O medo, a desinformação, a vaidade, o comodismo são estimulados nas mulheres jovens por uma visão médica obtusa, que as leva a crer que o parto cesáreo é a melhor solução para si mesmas e para seus filhos. Caminhando no sentido contrário das recomendações da Organização Mundial de Saúde, a medicalização do parto transforma uma experiência de vida única e plena de significado, não só para a mulher mas também para seu parceiro e o conjunto da família, em um evento cirúrgico padrão, sem nenhuma intimidade e com recuperação dolorosa para a mulher e quem sabe para o bêbê. O pior é que no Brasil de hoje, mesmo as mulheres que desejam fazer parto natural não encontram apoio para isso ou são convencidas de sua incapacidade com frases padrão do tipo “cesárea é mais segura que parto normal”, “você aguenta bem sentir dor?”, “você não tem passagem”, “o bebê não está descendo”, “está laçado”, “não quero correr esse risco”, etc...desistem à base do medo de serem abandonadas no meio do caminho. Seria bom que se explicasse à população brasileira como é que são feitos os partos nos países mais desenvolvidos e quais são os resultados estatísticos dessas práticas. É claro que um parto normal é um processo muito mais lento do que uma cesárea, o que traz inconvenientes aos médicos obstetras e também exige uma maior participação da mulher. Nesse sentido, o trabalho de enfermeiras especializadas em cuidados maternos seria de grande ajuda para que se pudesse recuperar no Brasil o respeito pela magia do ato de dar a luz, bem como pela marcante experiência humana do nascimento.

Helena Lutéscia Luna Coelho (Professora UFC)

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