O TETO SALARIAL PRECISA SER REGULAMENTADO.
O país foi surpreendido na semana
passada com a notícia de que uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados
aprovou uma proposta de emenda constitucional que acaba com o teto salarial dos
servidores públicos brasileiros. A proposta ainda será submetida ao plenário da
Câmara dos Deputados e, se aprovada, passará também pela apreciação do Senado.
Há, portanto, um longo percurso pela frente. É importante observar, no entanto,
que o limite remuneratório para os funcionários públicos, na prática, não
existe.
A Constituição estabelece, em seu
artigo 37, que o subsídio mensal do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)
é o teto da remuneração de todos os servidores públicos, incluídas no cálculo
as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza. Como esse dispositivo
nunca foi regulamentado, cada um dos Poderes interpreta o texto constitucional
à sua maneira.
No Senado e na Câmara, por
exemplo, uma gratificação por exercício de função não entra no cálculo do
limite. Os servidores com essa gratificação, e são centenas deles, podem
ultrapassar o teto, que hoje está em R$ 26,7 mil. Os Senadores podem também
acumular a remuneração pelo exercício do mandato com uma aposentadoria. Muitos
deles foram governadores e possuem aposentadoria pelo cargo que exerceram.
No Legislativo, numerosos servidores se aposentam e retornam à ativa
para exercer cargo em função comissionada. Eles passam a acumular os proventos
da aposentadoria com a remuneração do cargo que assumiram. Muitas vezes eles
trocam apenas de Casa: os que eram servidores da Câmara ocupam cargo em
comissão no Senado, e vice-versa. Com a entrada em vigor da lei de acesso à
informação, as mesas da Câmara e do Senado anunciaram que divulgarão os
salários de seus servidores, o que poderá explicitar essa situação.
No Judiciário, o assunto é regulado pelas resoluções 13 e 14 do
Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Pelas regras em vigor, o próprio ministro
do Supremo Tribunal Federal poderá ultrapassar o limite remuneratório se
estiver no exercício de função no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), pela qual
recebe uma gratificação. Um servidor aposentado do Judiciário pode, por
exemplo, fazer um concurso para juiz. A remuneração no cargo de magistrado não
será somada aos proventos da aposentadoria para o cálculo do teto.
O entendimento do Executivo é
diverso, pois o governo federal não aceita a acumulação dos proventos de
aposentadoria com o de remuneração por exercício de função comissionada. É
pedido ao funcionário que declare se tem outra fonte de renda. Os computadores são
programados para fazer o cruzamento com outras fontes de informação, de tal
forma que a situação irregular é identificada. O corte é feito automaticamente.
No Executivo, a ultrapassagem do
teto se dá de uma forma mais sutil, que beneficia apenas os funcionários do
escalão superior, aqueles que participam dos conselhos de administração e
fiscal de empresas públicas e de economia mista. Essas empresas pagam jetons
pelas participações nos conselhos, o que leva esses funcionários - ministros,
secretários-executivos de ministérios, secretários e subsecretários - a
acumular supersalários, alguns deles mais do que o dobro do subsídio de
ministro do STF.
A proposta aprovada pela Comissão
Especial da Câmara dos Deputados acaba com o teto remuneratório porque permite
que os proventos de aposentadorias possam ser acumulados com a remuneração do
exercício de cargo em
comissão. Acaba também com os subtetos para os servidores dos
Estados e dos municípios, que foram estabelecidos pela emenda constitucional
41, no primeiro ano do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com
o objetivo de evitar a farra dos supersalários.
Em vez de propor mudanças no
texto constitucional, o Congresso Nacional deveria regulamentar o dispositivo
da Constituição que estabelece o teto remuneratório e, desta forma, padronizar
o entendimento entre os três Poderes. Quando ainda estava no Senado, a
ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, apresentou um projeto de lei
propondo essa regulamentação. No projeto, ela especificava tudo o que seria
considerado no cálculo do teto e aquilo que ficaria fora. O projeto de Gleisi
dorme na gaveta de alguma comissão do Senado, pois não interessa aos Senadores
que acumulam aposentadoria e remuneração pelo exercício do mandato dar
seguimento a ele.
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